segunda-feira, 10 de setembro de 2012

Massacre Africa do Sul: MARIKANA E O ENTULHO AUTORITÁRIO[1]


A greve dos 28 mil operários mineiros de Marikana e o massacre 34 deles na África do Sul, pela policia fortemente armada, juntamente com a reação das autoridades políticas e policiais daquele pais chocaram a todos os ativistas e militantes sociais de nosso país. Particularmente por que sabemos que a população negra daquele país levou a cabo uma revolução que derrubou o sistema de apartheid. Regime racista imposto pela minoria branca sul-africana até 1994.

Atualmente 270 mineiros grevistas correm o risco de serem processados, pois, “fiquem impressionados”, estão sendo acusados de assassinato pelo massacre dos seus companheiros com base em uma lei do apartheid, que responsabiliza todos os participantes num protesto pelas mortes que nele ocorrerem.

Estes mineiros que trabalham com o corpo parcialmente coberto pela água e britadeiras de 25kg, sob o risco de desabamentos e esmagamento por rochas ganham salários de 500 dólares (4000 rands ou Mil reais).

Vale muito a pena ver as similitudes deste processo e do processo de derrubada da ditadura brasileira e a redemocratização.

Em primeiro lugar por que há uma identidade em como vivem no Brasil os trabalhadores, e na África do Sul. Todos em condições de vida e trabalho subumanas.

Lá vivem em barracos miseráveis nas comunidades ao redor das minas, sem condições de saneamento. Sempre sujeitos às doenças profissionais características da profissão: tuberculose e silicose que, aliadas aos acidentes, reduzem sua perspectiva de vida.

Aqui muitos setores operários vivem em condições parecidas, como exemplo, os trabalhadores da construção pesada que, muitas vezes, dormem em galpões perto das obras; e os trabalhadores mais pobres nas grandes cidades que moram em favelas e ocupações. O ritmo de trabalho das empresas brasileiras esta gerando uma verdadeira epidemia de doenças ocupacionais.

A diferença salarial entre negros e brancos na África do Sul é estimulada pelas subcontratação, método igual aos das terceiras brasileiras, que se aproveitam para superexplorar os trabalhadores.

No ramo petroleiro os índices chegam a 80% de trabalhadores terceirizados, com uma diferença descomunal de salários, entre os operários da Petrobras, das petroleiras privadas e, pior ainda, os das terceirizadas. Diga-se de passagem nos setores terceirizados se concentram a maioria dos operários negros do ramo.

Por outro lado o sindicato mais importante da mineração, o NUM (National Union of Mineworkers), fundado em 1982, peça central na luta contra o apartheid e eixo para a construção da central sindical COSATU, desde o fim do apartheid vem estabelecendo crescentes relações com as empresas mineradoras. A tal ponto que em 2012 tenha abandonado a luta pela nacionalização das minas, bandeira histórica do movimento na África do Sul.

Chegou até mesmo a criar uma empresa em 1995, a Mineworkers' Investment Trust, que em 2011 possuía ativos de 2,8 bilhões de rands e que possui investimentos inclusive nas empresas de mineração, como a Lonmin. Seus dirigentes ficaram milionários. Como Cyril Ramaphosa, ex-dirigente máximo do NUM, acionista minoritário da própria Lonmin. Seus dirigentes máximos ganham altos salários pagos pelo sindicato. Seu dirigente máximo Frans Baleni, ganha vinte e cinco vezes mais o que ganha um britador. [2]

Enfim passam a ser totalmente governista, por suas ligações com o CNA, e consequentemente totalmente patronais.

Qualquer semelhança com a realidade brasileira não é simplesmente coincidência.

Por isso o NUM e a COSATU não apóiam a greve dos mineiros e sua luta, nem rompem com o governo que enviou a polícia para massacrar o operários.

A violência policial é outro elemento de contato entre a realidade na África do Sul pós apartheid e o Brasil pós-ditadura. Lá a polícia mudou a cor de seus agentes, mas não as sua prática.

No Brasil, recordemos do Pinheirinho, a ação policial, mais que cumprir uma legislação ultrapassada, busca esmagar o movimento social. Lá como aqui, encurralaram os mais despossuidos e os massacraram covardemente.

Os aparatos de repressão mantiveram a mesma lógica de combate a população pobre que existia na época do apartheit. No Brasil a atividade policial ainda é baseada na ideologia da “segurança nacional” onde o principal combate é ao inimigo interno. Hoje negros, pobres e despossuidos.

Isso ocorre por que a transição negociada por Mandela e o Conselho Nacional Africano (CNA), permitiu que as estruturas de poder econômico ficassem nas mãos das grandes empresas. O CNA aderiu aos preceitos neoliberais favoráveis ao mercado e liderou uma onda privatista que vendeu, por preços rebaixados, as principais empresas do país, demitiu centenas de milhares de empregados públicos, autorizou as grandes empresas sul-africanas a transferirem suas matrizes deslocadas para Londres, ficando ao abrigo da lei do país.[3]

No Brasil as grandes empresas que financiaram a repressão e a ditadura, continuam ganhando muito dinheiro, recebendo subsídios do governo, isenções de imposto e explorando violentamente a classe trabalhadora.

A força econômica e política atual desses grupos também é resultante da forma como se procedeu a transição política no Brasil do regime ditatorial para o regime democrático. Com a consolidação destes grandes grupos monopolistas-bancário-financeiros se gabaritaram para manter suas projeções nos governos que seguiram ao fim do regime de exceção. Ainda que hoje ganhe mais visibilidade seus envolvimentos nos escândalos de corrupção.

Mas quando os trabalhadores se insurgem nos canteiros de obras, dentro das fabricas e nas estações metro-ferroviarias, a cara da ditadura, que sempre defenderam reaparece assim como as práticas impostas naquele tempo.

No Brasil como na África do Sul, os regimes ditatoriais, cheio de ódio contra a população mais carente e a classe operária caiu, mas a estrutura policial e legal continuou a mesma.

Na África do Sul como no Brasil a retirada do entulho ditatorial é fundamental para que novos massacres, como os que estão ocorrendo naquele pais não voltem a ocorrer. Lá e aqui.

[1] Américo Gomes e coordenador da Comissão de presos e perseguidos políticos da ex-Convergencia Socialista.
[2] Dados da matéria: “O massacre de Marikana: um divisor de águas na época pós-apartheid”, Escrito por Waldo Mermelstein, publicado no Correio Internacional. Dados copilados de Sakhela Buhlungu , http://books.google.com.br/books?hl=pt-BR&lr=lang_en&id=VZvma2zVuqAC&oi=fnd&pg=PA245&dq=sakhela+buhlungu+miners+num&ots=mcMUCgS5Mn&sig=dPSCo_Vs38apxNsGUUS-rddePI#v=onepage&q=sakhela%20buhlungu%20miners%20num&f=false , acessado em 29/08/12
[3] “O massacre de Marikana: um divisor de águas na época pós-apartheid”, Escrito por Waldo Mermelstein, publicado no Correio Internacional. Dados copilados de Sakhela Buhlungu ,http://books.google.com.br/books?hl=pt-BR&lr=lang_en&id=VZvma2zVuqAC&oi=fnd&pg=PA245&dq=sakhela+buhlungu+miners+num&ots=mcMUCgS5Mn&sig=dPSCo_Vs38apxNsGUUS-rddePI#v=onepage&q=sakhela%20buhlungu%20miners%20num&f=false , acessado em 29/08/12

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