terça-feira, 4 de setembro de 2012

Quem deve governar Campinas?


Estamos às vésperas de mais uma eleição municipal e nestes momentos o interesse da população sobre quem vai governar a cidade torna-se um dos principais pontos de discussão nos locais de trabalho, escolas e bairros.

Principalmente em Campinas, depois de ser desvendado o esquema de corrupção que atingia os altos postos da prefeitura, de serem derrubados pela Câmara Municipal o ex-prefeito Dr. Hélio (PDT) e seu vice Demetrio Villagra (PT) e de assumir o posto, em eleição indireta, Serafim (PDT) pelo voto de 23 vereadores. Tudo isso em poucos meses.

Para nós, socialistas, isto também é muito importante. Mas, devemos responder à pergunta “quem vai governar Campinas” com outra: “Qual classe social vai governar Campinas?”. Até hoje, inclusive no período de governo do PT, apenas uma classe social esteve no comando: a burguesia, isto é, os donos das fábricas, bancos, escolas privadas, os donos das grandes fortunas e dos grandes negócios. Aqueles que faturam milhões à custa de pessoas que trabalham por salários, na maioria das vezes, muito baixos.

Dizemos inclusive no governo do PT porque, quando o Toninho foi eleito em 2000, após uma linda campanha pelos bairros da cidade, da qual o PSTU orgulhosamente fez parte, acendeu a esperança de todos de que, “agora os trabalhadores vão governar”. Porém o que se viu foi uma sucessão de atos favoráveis à burguesia, desde o aumento das passagens de ônibus bem acima da inflação, ainda no primeiro ano de gestão, até a política de aumento zero para o funcionalismo, no período em que Isalene esteve à frente da prefeitura.

No entanto, foi lançada uma ideia nova, que empolgou muita gente: o Orçamento Participativo (OP), pelo qual a população seria chamada para opinar sobre o uso da verba da prefeitura e a construção de seu orçamento. No programa eleitoral de governo do PT estava escrito:

"Outra questão fundamental no OP é a discussão de todo o orçamento. A população não pode ser subestimada na sua capacidade de gestão. É preciso abrir todo o orçamento, os gastos de pessoal, serviços essenciais, investimentos e projetos de desenvolvimento, bem como os recursos extraorçamentários disponíveis para financiamento (…)"

O Orçamento Participativo na prática.

O OP, concebido dessa forma, seria uma arma importantíssima para a “inversão das prioridades” na cidade, como pregava o programa do PT. No entanto, o que se pôs em prática estava muito longe dessa promessa.

A área de ação do OP foi, de fato, 100%… mas apenas da parte do orçamento relativa aos novos investimentos, o que girava em torno de 5% do orçamento total. Os “gastos de pessoal”, por exemplo, estão fora desse item. E o PT[1] aproveitou para reduzir tais gastos, passando de 55% do orçamento em 2003 para 52% em 2004 e abrindo as portas para uma redução ainda maior (43%) no primeiro ano de gestão do Dr. Hélio, que era apoiado pelo PT.
A mesma coisa aconteceu com os “serviços essenciais”. Estes continuaram entregues às empresas privadas de ônibus, de coleta de lixo, ao mesmo tempo em que a dívida do município era paga religiosamente aos agiotas de sempre: bancos e especuladores de títulos públicos. Em 3 anos (2001 a 2003) o PT pagou, entre juros e encargos, um bilhão de reais, enquanto a dívida aumentava, de janeiro a outubro de 2002, de 1,18 bilhão para 1,27 bilhão.
O OP não teve o direito de opinar em nenhum desses assuntos. Ficando reduzido a uma fatia minúscula do bolo, o OP não cumpriu o papel ao qual se destinava, de se fazer um governo voltado aos trabalhadores, enquanto a burguesia continuou tendo papel ativo na definição da fatia maior, os 95% do orçamento, através da câmara dos vereadores, de sua influência econômica e, é claro, através da corrupção.

É por isso que duas estudiosas afirmam a respeito do OP:

"A disputa sobre os investimentos não é a principal disputa sobre a renda no município. Os grandes poderes econômicos estão principalmente ligados ao capital agrícola, industrial, imobiliário, ao transporte coletivo. Seu interesse decide-se mais na definição de regras de parcelamento do solo (urbano ou rural), nas licitações (grandes obras, coleta e destinação do lixo, transportes), nas isenções de impostos (IPTU e ISS) para indústrias, clubes. Estes setores não precisam do OP para garantir seus ganhos.(Maria do Carmo Carvalho e Débora Felgueiras)"

Outro aspecto do OP é a forma em que foi concretizado. Na prática, faziam-se duas assembleias gerais por ano, por regiões, nas quais se elegiam representantes e se aprovavam as principais demandas. A partir daí era composto um conselho municipal  (COP) de 100 membros e um comitê executivo de 3 pessoas. Uma estrutura vertical de deixava de fora a participação popular na maior parte do ano. Além disso, o COP de Campinas foi dominado por pessoas com altos salários e com formação superior, um espelho bem deformado da população campineira. 72% dos conselheiros tinha renda acima de 4 salários mínimos (entre estes, 40% tinha renda superior a 8 SM) e 48% tinha curso superior. Apenas 3,7% tinha renda até 2 SM, que é o que recebe a maioria da população.

Por fim, o movimento sindical tinha uma participação de apenas 4% to total. Isto é, dos 100 conselheiros do COP, apenas 4 eram ativistas sindicais. A participação da juventude também era bem pequena, de apenas 6% de jovens entre 16 e 25 anos. E a participação das mulheres ficava abaixo de sua presença real na população. Apenas 30% dos membros do COP eram mulheres.

Com este quadro, não se poderia esperar coisas diferentes do que aconteceram. Em 4 anos de governo do PT, 3 anos com greves longas dos trabalhadores municipais, aumentos da passagem de ônibus bem acima da inflação e degradação dos serviços públicos (que os 7 anos de governo do Dr. Hélio terminaram por devastar). Ao mesmo tempo, nenhum ataque aos lucros dos patrões, que continuaram enriquecendo sem nenhum problema.
Hoje o OP ainda existe, mas não passa de mais uma arma eleitoral nas mãos de quem está na prefeitura.

A proposta do PSTU: conselhos populares que decidam sobre 100% do orçamento e da gestão dos serviços.

O OP parte do conceito de “cidadania”. Isto é, não faz distinção entre trabalhadores e patrões, entre explorados e exploradores, tentando passar a mensagem de que é possível governar para ricos e pobres igualmente. É a mesma mensagem que os patrões tentam passar a seus “colaboradores” (os trabalhadores explorados) de que “devemos todos vestir a camisa da empresa”, ou que “estamos todos no mesmo barco”.

O PSTU parte de um conceito oposto. O conceito de classe para analisar a sociedade, classes irreconciliáveis. De um lado os patrões, de outro os trabalhadores. Se um ganha, o outro perde. Não há como conciliar interesses, principalmente na esfera econômica, pois qualquer aumento de salário dos trabalhadores reduz o lucro dos patrões, qualquer aumento de gastos sociais no orçamento reduz a parte que vai para os serviços terceirizados ou o pagamento da dívida aos banqueiros. E não há como mudar esta realidade no capitalismo.

Então, para responder à pergunta “qual classe deve governar a cidade”, nós respondemos: os trabalhadores e a população pobre. E aprender com os fatos passados, inclusive com a experiência do OP, pode fazer-nos mais fortes para enfrentar as dificuldades que virão num possível governo do PSTU.

Para isso, a participação popular no governo deve ser nossa prioridade. Não apenas em assembleias duas vezes por ano. Mas permanentemente. Para isso, vamos incentivar a formação de Conselhos Populares organizados pela própria população, com funcionamento contínuo, e que terá sob sua responsabilidade deliberar, não apenas sobre a aplicação de 100% do orçamento da cidade, mas também discutir as principais questões políticas enfrentadas pela prefeitura. Por exemplo, frente à Lei de Responsabilidade Fiscal, aprovada no Congresso Nacional, que determina os gastos das prefeituras; ou frente à política de acumular superávit do governo federal (isto é, economizar no orçamento para pagar a dívida pública), o que faz com que o repasse federal às prefeituras seja cada vez menor.

Também, teremos que desenvolver mecanismos políticos que impeçam que os Conselhos sejam dominados por representantes da burguesia, incentivando a participação dos trabalhadores mais pobres, das mulheres trabalhadoras e da juventude. Também precisaremos criar meios de aumentar a participação do movimento sindical, quebrando a barreira que existe entre a luta salarial através dos sindicatos e as lutas nos bairros por melhores condições de vida. Queremos que diretores de sindicatos, cipeiros, membros de comissões de base, grevistas, moradores de ocupações tomem conta dos Conselhos, aliados à população pobre e carente das periferias da cidade.

Para isso, é necessário começar desde já, sem esperar que o PSTU ganhe a eleição. A tarefa de criar Conselhos, embora possa ter um incentivo importante com a vitória de um partido socialista nas eleições, como o PSTU, é uma tarefa que passa por fora do poder constituído, é uma tarefa dos trabalhadores e dos movimentos sociais para construírem seu poder autônomo e independente da burguesia e de suas instituições.
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Nota:

[1] Embora o PSTU tenha feito campanha coligado com o PT, não fez parte de seu governo.


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