“Esses territórios pertencem ao povo Garifuna e não podem ser entregues ao capital estrangeiro em um gesto de puro colonialismo, idêntico àquele que prevalecia em Honduras na época em que o país era chamado de república das bananas”, afirmam grupos civis e movimentos indígenas
Classificado pelo governo do presidente Porfirio Lobo como “o mais importante projeto do país em meio século”, Honduras assinou nesta quinta-feira (06/09) um memorando no qual aprova a privatização de três cidades. Com agentes de segurança, sistema tributário e legislação própria, elas já estarão abertas para investimentos de empreendedores em um prazo máximo de seis meses.
A ideia é que as chamadas “cidades modelo” possuam poderes Executivo, Legislativo e Judiciário totalmente desvinculados do governo hondurenho. Dessa forma, suas administrações ganham autonomia suficiente para ratificar tratados internacionais, firmar parcerias bilaterais e estabelecer sua própria política imigratória.
Um grupo de investidores estrangeiros viajou a Tegucigalpa para participar da cerimônia e também assinou o documento. O argumento do governo é de que esta é uma forma de fortalecer a infra-estrutura nacional, bem como o combate à corrupção e ao tráfico de drogas. “Isso tem o potencial transformar Honduras em uma máquina de dinheiro, é um instrumento de desenvolvimento típico de países de primeiro mundo”, disse à AFP Carlos Pineda, presidente da Comissão para a Promoção de Parcerias Público-Privadas de Honduras.
De acordo com Juan Hernandez, presidente do Congresso hondurenho, o grupo de investimentos MGK já se comprometeu a injetar inicialmente 15 milhões de dólares para a construção de infra-estrutura básica na primeira cidade modelo, na região da costa caribenha. A expectativa do parlamentar é a de que esta cidade crie cerca de cinco mil postos de trabalho em um primeiro momento e mais de 20 mil no futuro. Ele também revelou à AFP que a Coreia do Sul já depositou nos cofres hondurenhos quatro milhões de dólares voltados para estudos de viabilidade das obras.
“O futuro se recordará de hoje como o dia em que Honduras começou a crescer”, disse Michael Strong, CEO do grupo MKGroup em meio à solenidade de ratificação do memorando. “Nós acreditamos que esta será uma das transformações mais importantes do mundo, pela qual Honduras acabará com sua pobreza e criará milhares de empregos”, concluiu.
Não é o que pensam grupos civis e organizações indígenas que classificam o projeto de Porfírio Lobo como uma “catástrofe”. Ao lado do local onde será instalada a primeira cidade privada do país, vive uma grande comunidade de indígenas Garifuna que se opõe ao empreendimento. “Esses territórios pertencem ao povo Garifuna e não podem ser entregues ao capital estrangeiro em um gesto de puro colonialismo, idêntico àquele que prevalecia em Honduras na época em que o país era chamado de república das bananas”, disse Miriam Miranda, presidente da Organização Fraternal dos Negros de Honduras.
Oscar Cruz, ex-promotor constitucional, protocolou uma moção junto à Suprema Corte ainda em 2011 para alertar sobre a inconstitucionalidade do projeto. “Essas cidades pressupõem a criação de estados dentro do estado, uma entidade comercial com poderes de estado fora da jurisdição do governo”, explica Cruz. A instância judicial máxima de Honduras não concordou com seus argumentos.
“Isso violará os direitos de cada cidadão porque significa a concessão de parte de nosso território a uma cidade que terá sua própria polícia, seu próprio Poder Judiciário e seu próprio sistema tributário”, disse ao jornal britânico The GuardianSandra Marybel Sanchez, parte de um grupo de manifestantes que tentam apelar à Suprema Corte para reverter a decisão.
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